quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Jovens Talentos?

Na linha de várias outras declarações públicas de responsáveis de todos os quadrantes políticos e de dirigentes empresariais e académicos, também o Ministro Miguel Relvas – que tutela a pasta da Juventude do actual Governo, defendeu em Braga que “esta é a geração mais bem preparada da história para ter sucesso. Mas a verdade é que não temos sido capazes de proporcionar aos jovens a possibilidade de poderem integrar a vida activa no seu País”.
Estas declarações foram proferidas na Sessão Oficial de Abertura da iniciativa “Jovens Talentos”, uma realização da responsabilidade da Secretaria de Estado do Desporto e da Juventude que tem como objectivo “dar a conhecer o trabalho dos jovens que mais se distinguem nas mais variadas áreas e que, na maioria dos casos, são desconhecidos para a maioria dos portugueses”. Curiosamente, entre o grupo de jovens que Sábado foram apresentados como exemplo de talento nos diversos domínios apenas se encontra um desportista: Hugo Chapouto, arquitecto e campeão mundial de patinagem artística.
Portugal é, ainda assim, um país em que ainda proliferam os “talentos” no campo desportivo, sendo também verdade que os mesmos dificilmente conseguem a sua afirmação plena intra-muros.
Não é assim por acaso que muitos dos nossos jovens de maior potencial são induzidos a desenvolver a sua preparação (e as suas carreiras profissionais no exterior), quer por força das melhores condições de treino e desenvolvimento das suas capacidades, quer por via das mais atractivas condições remuneratórias que lhes são disponibilizadas.
De forma transversal a todas as modalidades mas com exemplos clarividentes no futebol, no ténis, nos desportos motorizados, no atletismo, no andebol, no hóquei em patins, na natação, etc., Portugal é há muito um país exportador de jovens talentos desportivos.
Neste fenómeno há todavia que destrinçar entre aquilo que é o impulso natural dos visados face às ditas melhores condições proporcionadas pelo exterior e aquilo que – de forma mais próxima com o que se passa nos outros sectores de actividade – resulta da efectiva indisponibilidade de oportunidades para a afirmação do seu talento no País natal.
Nesta perspectiva, a primeira vertente tem que ser “atacada” com políticas proactivas ao nível da qualidade das infra-estruturas disponíveis, da qualificação dos méis técnicos e humanos, das abordagens do desporto escolar e universitário, das iniciativas locais e nacionais de apoio à formação desportiva e demais factores que aportem contributos para o reforço da competitividade dos nossos atletas.
Quanto à segunda questão, a mesma sente-se de forma galopante nas modalidades colectivas por via da flexibilização das regulamentações, abrindo campo à apresentação de equipas integralmente compostas por estrangeiros que vedam o acesso aos nossos atletas de maior potencial. Mais uma vez, de forma cada vez mais transversal às diferentes modalidades.
Ora, o esmagamento do período de afirmação e maturação dos nossos atletas tem tido reflexos claramente negativos nas camadas jovens das diferentes selecções e condiciona em larga escala o sucesso futuro das selecções principais.
Não será por acaso que, nos Jogos Olímpicos de 2012, em Londres, será residual o conjunto de participações de portugueses em desportos colectivos, na sua maioria concentrados em desportos náuticos.
É que, no que concerne a dar oportunidades aos seus jovens talentos, Portugal continua a meter água… Até quando?

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

O futebol em Portugal - d. M.

As eleições para a Direcção da Federação Portuguesa de Futebol do próximo mês de Dezembro marcam necessariamente um ponto de viragem nesta estrutura associativa da principal modalidade desportiva no nosso País.
Afinal, cessará funções o seu actual Presidente, Gilberto Madaíl, cujo mandato se prolonga há já 15 anos, coincidindo com o período de maior sucesso e prestígio da selecção nacional de futebol, o “Clube Portugal” como entretanto passou a designar-se.
Em verdade, se todos podemos recordar a presença nos Mundiais de 66 (Inglaterra) e 86 (México) – ainda que com desempenhos radicalmente opostos – foi sob a égide de Madaíl que a Selecção Nacional marcou presença em todas as demais competições internacionais, do Euro-96 (Inglaterra, novamente) ao Mundial de 2010 (da África do Sul), com excepção do Mundial de 98 (de cuja qualificação não podemos esquecer o nome de Marc Batta, indelevelmente associado ao empate com a Alemanha no jogo decisivo).
De então para cá, a Selecção Portuguesa juntou-se ao restrito clube da elite internacional que marcou presença em todas as competições e, em boa parte dos casos, em condições de disputar as provas e com desempenhos globalmente positivos, ainda que, por razões várias, aquém do que seria possível esperar em algumas dessas situações.
Dai que vejamos a quase totalidade da dita “Geração de Ouro” do futebol português a pendurar as chuteiras sem que qualquer troféu tenha sido trazido para o nosso País, ou aqui retido como podia (e devia) ter acontecido no Euro-2004.
Ao longo desta década e meia, novos valores emergiram e a Selecção Nacional conseguiu guindar-se a um elevado patamar de qualidade futebolística, de desempenho desportivo e de retorno financeiro, transformando esta vertente da actuação da Federação numa verdadeira máquina de fazer dinheiro, capaz mesmo de compensar os “luxos” novo-riquistas exibidos em múltiplas circunstâncias, como mais uma vez ficou patente no Estágio que antecedeu o Mundial da África do Sul.
Antes, já a Selecção se demonstrara capaz de atrair e remunerar – também com o apoio de parceiros empresariais – um treinador com a cotação internacional do então Campeão do Mundo, Luiz Felipe Scolari, com o qual viveu também um dos períodos de maior mobilização popular dos tempos recentes.
Também sob a égide de Gilberto Madaíl, a Selecção Nacional abriu-se a uma primeira vaga de “naturalizações de jogadores nascidos no Brasil”, em linha com a tendência de globalização que marca a generalidade das modalidades em quase todos os países mundiais.
No reverso da medalha, o período de gestão de Madaíl ficou marcado por várias ocorrências menos abonatórias para a imagem da Selecção, as quais – como mais uma vez aconteceu há bem pouco tempo – nunca mereceram uma atitude credibilizadora, disciplinadora e exemplar de quem decide na estrutura federativa. À cabeça destes episódios, a agressão de Scolari a um jogador sérvio foi o exemplo claro da prioridade dada à vertente económica da gestão da Selecção Nacional em detrimento de outros valores porventura exigíveis e mais relevantes.
Com o futebol profissional doméstico entregue à respectiva Liga desde momento anterior à chegada de Madaíl, a gestão do actual Presidente da FPF ficou marcada pela indefinição e falta de consenso em torno dos modelos competitivos dos demais patamares do futebol nacional e por sucessivas queixas da falta de apoio cabal à formação desportiva.
Para lá destes e dos múltiplos problemas que se arrastam há décadas, por exemplo, ao nível da representatividade internacional, da arbitragem, das infra-estruturas, da formação dos dirigentes e demais agentes desportivos, a nova Direcção da FPF também terá que lidar com a emergência e novos fenómenos, como o futebol feminino ou a dinâmica crescente do Futsal.
Mas, estou certo, tudo o mais será perdoado, assim a Selecção Nacional seja capaz de conquistar o título que persegue, se possível, já na final de Kiev, em Julho de 2012.

sábado, 5 de novembro de 2011

As contas das SAD

O julgamento do presidente e administradores da União de Leiria SAD pelo crime de abuso de confiança fiscal na forma continuada que esta semana começou no Tribunal de Leiria, merece especial destaque por força do testemunho da Técnica Oficial de Contas Leiriense que revelou que a sociedade terá dificuldades em manter a sua actividade.
Embora a existência das Sociedades Anónimas Desportivas conte já com mais de uma década no nosso País, a verdade é que nos deparamos ainda hoje com múltiplas realidades, desde clubes que agora pretendem enveredar por este modelo, a situações de pré-insolvência como a antes referida, aos bem mais significativos desempenhos das SAD dos principais clubes.
Em relação a estas, o diagnóstico há muito que estava traçado: de uma forma geral, os pesados encargos suportados com o seu funcionamento, com o seu passivo bancário e com os custos associados aos enormes investimentos realizados (nos seus estádios, pavilhões e centros de estágio e treino) só conseguem ser compensados por uma de duas vias: ou através de desempenhos excepcionais na vertente desportiva, nomeadamente em sede de competições europeias e da Liga dos Campeões de forma particular, ou através de alienação dos seus activos (jogadores ou treinadores).
Ainda do lado dos custos / investimento há ainda que acrescer às parcelas antes enunciadas o próprio investimento na contratação de recursos que possam contribuir para o tal sucesso desportivo e o concomitante resultado financeiro.
A gestão de uma Sociedade Anónima Desportiva é assim feita nesse ténue equilíbrio entre os custos “fixos” estruturalmente assumidos, as opções de investimento adoptadas para cada momento e o resultado alcançado, que sempre depende de contingências múltiplas, bastas vezes fora do seu controlo.
Há aqui uma verdadeira dialéctica financeira entre o “risco” que se pretende assumir – traduzido nos investimentos em recursos de maior qualidade que poderão potenciar o desejado sucesso desportivo – e o “retorno” que dos mesmos poderão advir, assim se conjuguem favoravelmente os diversos factores que o podem viabilizar.
Pela positiva, dir-se-ia que o sucesso é auto-sustentável: os bons resultados desportivos, trazem proveitos financeiros, valorizam os recursos, potenciam transacções e atraem o apetite de recursos de maior qualidade.
Neste caso, a chave do êxito assenta na capacidade de garantir a substituição dos recursos alienados por outros de qualidade idêntica, através de formação interna ou de uma área de prospecção capaz.
Da mesma forma, um trajecto de insucesso transforma-se numa espécie de ciclo vicioso: a ausência de resultados condiciona o potencial de angariação de receitas, desvaloriza os recursos e desincentiva a realização de novos investimentos. A solução para reverter este trajecto não é facilmente identificável ou não é financeiramente exequível, mais a mais na actual conjuntura.
Se é fácil fazer associações entre estes estereótipos e a nossa realidade envolvente, é também importante que os responsáveis das diferentes SAD saibam estar atentos aos bons e aos maus exemplos, de forma a beber as melhores práticas e a evitar as opções insustentáveis.
No que nos diz mais directamente respeito, só podemos congratularmo-nos pelo progresso sustentado que a SAD do Braga vem registando, conjugando o crescimento desportivo com o desejável desempenho financeiro (que possibilita a obtenção de resultados positivos, a amortização do passivo acumulado, a sustentação de orçamentos mais ambiciosos e a libertação de meios para a concretização de projectos mais arrojados).